quarta-feira, 19 de maio de 2010

Decisão judicial pode assegurar direitos fundamentais que acarretem gastos orçamentários

Em decisão unânime, a Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reconheceu a possibilidade de determinação judicial assegurar a efetivação de direitos fundamentais, mesmo que impliquem custos ao orçamento do Executivo. A questão teve origem em ação civil pública do Ministério Público de Santa Catarina, para que o município de Criciúma garantisse o direito constitucional de crianças de zero a seis anos de idade serem atendidas em creches e pré-escolas. O recurso ao STJ foi impetrado pelo município catarinense contra decisão do Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC).

O TJSC entendeu que o referido direito, reproduzido no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), é um dever do Estado, sendo o direito subjetivo garantido ao menor. Ele assegura a todas as crianças, nas condições previstas pela lei, a possibilidade de exigi-lo em juízo, o que respaldou a ação civil proposta pelo MP estadual, devido à homogeneidade e transindividualidade do direito em foco.

Ainda de acordo com a decisão do TJSC, a determinação judicial do dever pelo Estado não caracteriza ingerência do Judiciário na esfera administrativa. A atividade desse dever é vinculada ao administrador, uma vez que se trata de direitos consagrados. Cabe ao Judiciário, por fim, torná-lo realidade, mesmo que para isso resulte obrigação de fazer, podendo repercutir na esfera orçamentária.

No recurso, o município de Criciúma alegou violação a artigos de lei que estabelecem as diretrizes e bases da educação nacional, bem como o princípio da separação dos Poderes e a regra que veda o início de programas ou projetos não incluídos na Lei Orçamentária Anual (LOA). Sustentou também que as políticas sociais e econômicas condicionam a forma com que o Estado deve garantir o direito à educação infantil.

Em seu voto, o ministro relator, Humberto Martins, ressaltou que a insuficiência de recursos orçamentários não pode ser considerada uma mera falácia. Para o ministro, a tese da reserva do possível – a qual se assenta na ideia de que a obrigação do impossível não pode ser exigida – é questão intimamente vinculada ao problema da escassez de recurso, resultando em um processo de escolha para o administrador. Porém, a realização dos direitos fundamentais, entre os quais se encontra o direito à educação, não pode ser limitada em razão da escassez orçamentária. O ministro sustentou que os referidos direitos não resultam de um juízo discricionário, ou seja, independem de vontade política.

O relator reconheceu que a real falta de recursos deve ser demonstrada pelo poder público, não se admitindo a utilização da tese como desculpa genérica para a omissão estatal na efetivação dos direitos fundamentais, tendo o pleito do MP base legal, portanto. No entanto, o ministro fez uma ressalva para os casos em que a alocação dos recursos no atendimento do mínimo existencial – o que não se resume no mínimo para a vida – é impossibilitada pela falta de orçamento, o que impossibilita o Poder Judiciário de se imiscuir nos planos governamentais. Nesses casos, a escassez não seria fruto da escolha de atividades prioritárias, mas sim da real insuficiência orçamentária.
FONTE: Superior Tribunal de Justiça

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